Praticamente desde que entrei na blogoesfera literária que me deparo com constantes dúvidas acerca do número de livros que os bloggers lêem. Como assim, aquela pessoa consegue ler 100 livros num ano? 200, nem pensar! Só pode ler na diagonal ou então essa pessoa está claramente a mentir. Chegaram a deixar-me comentários por aqui a duvidar precisamente do número de livros que lia na altura, e quando respondi que se não lesse como é que conseguia opinar, a pessoa deu a entender que, para além de não ler o que afirmava, ainda inventava nas opiniões.
Tentanto desconstruir o raciocínio do cético, a primeira coisa que me ocorre é algo que está enraizado na grande maior parte das pessoas, que é a dificuldade de aceitar que outras pessoas vivam a sua vida de uma forma diferente da sua e que gastem o seu tempo com coisas diversas. Isto é uma grande generalização, eu sei, mas é a realidade. O questionar do fugir da norma vê-se em tudo o que respeita à nossa vida em sociedade, e o melhor exemplo de todos é a já clássica sequência de questões: quando é que arranjas namorado/a? Quando é que te casas? Quando é tens um filho? Então e agora o segundo? Vê lá que já tiveste dois meninos/as e agora está na hora de mandares vir a/o menina/o. Como se a nossa vida tivesse de seguir um guião pré-definido, previamente aceite pela sociedade que nos rodeia.
Em 2017, defini o objetivo de ler 60 livros. Estamos no fim de outubro e já ultrapassei essa meta, mas se não tivesse ultrapassado ou se chegasse a dezembro e não a alcançasse, para mim também estava muito bem. O número é apenas uma referência, uma forma de me tentar suplantar, e encaro-o como uma forma positiva de olhar para a minha vida de leitora, mas compreendo perfeitamente quem não quer estabelecer metas e que acha que fazê-lo só coloca uma pressão desnecessária sobre o que vai lendo, quando no fundo o que interessa é a qualidade do que se lê e não a quantidade. Aceito esta forma de olhar para as coisas apenas como uma alternativa àquela que utilizo. Não tenho de julgar quem pensa de forma diferente da minha.
60 livros é muito? Para a esmagadora maioria dos portugueses, diria que sim. Para mim, é um número normal, que sei que posso ultrapassar facilmente se a isso me dedicar. No ano em que mais li, 2014, cheguei aos 116 livros e nessa altura também trabalhava a tempo inteiro e tinha um filho com dois anos. O que é que fiz de diferente, então? Resume-se a duas palavras: disciplina e vontade. Dependerá muito dos livros, mas há algum tempo percebi que para chegar aos 100 livros por ano, uma média diária de 100 páginas deverá chegar. O meu ritmo é, em média, de 50 páginas por hora, o que significa que teria de dispensar 2 horas em cada dia para ler. 10 horas por semana. Acham isto assim tão difícil, mesmo com trabalho, família e amigos? Entre finais de dia e fins-de-semana, não acho nada extraordinário arranjar 2 horas para ler, se estiver disposta a abdicar de redes sociais, televisão e outras coisas que vão sugando o nosso tempo livre nos dias que correm.
Se algum dia tiverem dúvidas sobre se alguém consegue realmente ler o número de livros que advoga, pensem que cada pessoa tem o seu ritmo, cada pessoa dedica o seu tempo livre a coisas diferentes, cada pessoa é uma pessoa que não merece que um estranho duvide e questione o facto de ter decidido empregar boa parte dos seus dias a percorrer páginas de um livro. É antes de louvar, não acham?