Autor: Isabel Rio Novo
Ano de Publicação: 2016
Editora: Dom Quixote
Páginas: 160
ISBN: 9789722059275
Origem: Comprado
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Subvertendo as estratégias da narrativa histórica, com saltos cronológicos que deixam o leitor em suspenso mesmo até ao final, Rio do Esquecimento descreve com saboroso detalhe a sociedade portuense de Oitocentos e assinala o regresso à ficção portuguesa de uma escrita elegante que consegue tornar transparente a sua insuspeitada espessura.
Opinião: Viajamos ao Porto de meados do século XIX, onde um português regressa com a sua fortuna do Brasil, onde tinha permanecido largos anos. Teresa, a sua filha bastarda que ficou em Portugal, é reconhecida como herdeira e logo se lhe arranja um noivo de boas famílias e reputação, que, no entanto, continua a nutrir uma grande paixão pela esposa de um amigo. É em torno deste enredo e dos seus desenvolvimentos que a narrativa vai girando, de uma forma não linear – ou seja, com saltos constantes entre os vários anos marcantes na vida destas pessoas. A forma como a autora o faz não convida a uma leitura rápida ou de um incessante virar de páginas; pede antes uma leitura atenta ao detalhe, pois, tal como afirma, “não pensem que um escritor consciencioso escreve uma linha só que seja com o intuito de encher papel; que invente um episódio para seu recreio: tudo aqui vem a propósito […]“.
A leitura deste livro permitiu-me conhecer a lenda do “rio do esquecimento”, que vem do tempo dos romanos. Este povo acreditava que a fronteira entre o mundo dos mortos e o mundo dos vivos era o rio Lethes, ou rio do esquecimento; ao beber daquela água, poder-se-ia atravessar para o mundo dos mortos esquecendo tudo o que acontecera em vida. Esta lenda tem óbvia influência na componente sobrenatural deste romance, que lhe dá um toque de originalidade de que gostei bastante.
Este foi um daqueles livros que achei uma delícia ler. Ainda que as descrições longas e palavras difíceis tenham dificultado um pouco a leitura no início, com o avançar da narrativa este estilo começou a entranhar-se. Gostei realmente das pessoas desta história, ou melhor, gostei de conhecer as suas vidas, uma vez que nem todas são pessoas que gostássemos de ter conhecido. Todo o contexto histórico é bem conseguido, fazendo o leitor acreditar que, de facto, viajou ao século XIX e a presença de um narrador omnisciente, que volta e meia intervém na história, foi também um detalhe que apreciei particularmente.
Achei que o Rio do Esquecimento terminou depressa demais, não porque considere que a história precisasse de ser maior ou que o enredo/personagens devessem ter mais desenvolvimento, mas porque este livro foi como aquelas histórias que nos são contadas e nos embalam de tal modo que desejamos que durem para sempre. Não penso que seja um livro perfeito, mas posso dizer-vos que vou querer ler tudo o que Isabel Rio Novo publique daqui em diante. Recomendo.
É, pois, certo que o tempo e o modo como se vive o tempo mudam conforme avançamos em idade, e talvez seja esse o único poder que temos sobre ele, o de o sentirmos por dentro de nós. Correm os anos, as estações sucedem-se na sua monótona regularidade, e no seu deslizar tão rapidamente formam, seguindo-se uns aos outros, um todo compacto, que os seus vários contornos se confundem num só, tal como as linhas diversas de um edifício se estampam ao longe no horizonte, resumidas numa linha única. Parece-nos, então, que ocorreu ainda ontem o que se produziu muitos anos antes, e os acontecimentos, separados por longos intervalos, vêm a condensar-se num só período, que constitui aquilo que chamamos, à falta de melhores termos, o passado.
Classificação: 4/5 – Gostei Bastante