Leitor Convidado (9)

Antes de mais quero agradecer à Célia o convite para participar na rubrica do Leitor Convidado.

 

Tenho duas grandes paixões que competem pela minha atenção: fantasia especulativa que há pouco mais de um ano tomou forma, aliada a outros tantos apaixonados e deu origem à Clockwork Portugal – uma comunidade de Steampunk que organiza a Euro Steam Con – Porto; a outra grande paixão é o Oriente. Quando o momento de escolher um tema para falar, e como de Steampunk já falo eu sempre, decidi-me por falar um bocadinho do meu fascínio pelo Oriente, quer seja na forma de séries televisivas como de manga.

 

O meu caminho penso ter sido idêntico a muitos outros fãs do Oriente (com especial ênfase no Japão e na Coreia do Sul): tudo começou com as séries exibidas nos canais generalistas (sim, no passado distante apenas havia RTP, SIC e mais tarde a TVI e, bem, era a loucura com tanto canal disponível 😛 ) – O DragonBall na SIC, depois os Power Rangers com aqueles fatos e inimigos tão exuberantes (não me estou a lembrar de mais adjectivos para os descrever neste momento) e mais tarde o Samurai X na TVI.

 

Um dia vi parte do Princesa Mononoke do Hayao Myiazaki na RTP2 e com o acesso à internet comecei a pesquisar, pois queria ver mais, conhecer mais… e assim abri a porta a um mundo completamente novo, com uma linguagem muito própria, um traço e história completamente diferente, com uma cultura vasta e fascinante de gentes que habitavam do outro lado do globo.

 

Do anime/animação para as manga

Com o passar do tempo e quanto mais anime e filmes consumia, não demorou muito para descobrir que por trás de muitos deles estavam livros de banda desenhada: as manga.

 

Há cerca de 10 anos, idas à FNAC ou compras online eram para mim um futuro muito distante e o acesso aos livros de manga era quase impossível fora dos circuitos de scanlations (não há termo português para a coisa 😉 ) de fãs dedicados que todas as semanas os traduziam e disponibilizavam online, conforme os capítulos eram publicados nas revistas japonesas (como a Shonen Jump, por exemplo). Digam o que disserem, mas o acesso “ilegal” a estes conteúdos alimentou uma geração que agora tem poder de compra para ter uma pequena biblioteca de manga que adorou e mal teve oportunidade comprou todos os livrinhos físicos.

 

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Pouco tempo depois mergulhei em algumas fandom de universos que hoje em dia são fenómenos de popularidade só comparáveis ao DragonBall: Naruto e Bleach. Era normal encontrarem-me nesses tempos a aguardar impacientemente todas as sextas-feira feiras à noite, em frente ao computador a fazer refresh à página do grupo que fazia a scanlation para poder ser das primeiras a ler os capítulos semanais e discutir os últimos desenvolvimentos com fãs de todo o mundo. O “comboio” do Inuyasha apanhei já a meio, mas mesmo assim conheci muitas pessoas interessantes, espalhadas um pouco por todo o mundo, neste caso mais no Brasil pois ajudei à edição e revisão das scanlations do manga, pois não se encontrava ainda licenciado para a língua portuguesa e mesmo em inglês era difícil conseguir cópias na altura. Ao fim de tantos anos (cerca de uma década, mais ano menos ano) ainda mantenho algum contacto com algumas dessas pessoas, por vezes meio a brincar meio a falar a sério, digo que antes das redes sociais (Facebook, Twitter, etc) existiam os discussion boards, fóruns e o fanfiction.net que tantos fandoms criou, alimentou e juntou. 🙂

 

Da animação para o live-action

 

Como já referi acima, muitos dos anime eram adaptações (mais ou menos) directas de manga e muitas vezes essas histórias deram também o salto para séries e filmes live-action (p.e. Boys over FlowersHotaru no Hikari e mais recentemente o Rurouni Kenshin, conhecido em Portugal por Samurai X).

 

Os japoneses (e também os Sul Coreanos, com as suas manhwas) têm um fascínio muito grande pelas suas bandas desenhadas e todos as lêem independentemente da idade, estatuto social ou ocupação. Existem em todos os formatos e feitios, divididas em categorias e sub-categorias – segundo temáticas, abordagem e o público ao qual é dirigida, um paralelo com os nossos géneros literários. Por exemplo, as manga shonen são principalmente direccionadas ao público masculino, enquanto as shoujo são mais para raparigas e o seinen/josei para leitores masculinos/femininos mais adultos com temas mais maduros e níveis maiores de violência e “situações adultas”. Mas as diferenças entre os vários “géneros” de manga não ficam apenas pelos nomes que lhes podemos dar, também o próprio traço e “linguagem” varia.

 

(Inuyasha – Shojo / Bleach – Shonen)

 

Uma coisa puxa outra e de repente estava imersa na indústria cinematográfica japonesa. Comecei pelos filmes de ficção-científica e fantástico, passando pelos históricos e um dia descobri a indústria Sul Coreana, apaixonei-me pela língua e nunca mais larguei… Comecei pela série The Legend, que acompanhei em real-time à medida que cada episódio ia saindo, e no momento em que conheci a série The First Shop of the Coffee Prince vi que já não havia volta a dar… abri nova porta para um mundo ainda mais vasto.

 

Não tardei em mergulhar de cabeça no mundo dos k-drama e j-drama e desde o longínquo ano de 2007 nunca mais quis outra coisa.

 

Porquê o fascínio?

Perdi a conta das vezes em que me fizeram esta pergunta… pergunta que pensando bem tem toda a lógica para ser feita.

  • As culturas a que se reportam estas séries/filmes/livros encontra-se a milhares de quilómetros de distância;
  • São culturas e linguagens completamente distintas da nossa cultura e da anglo-saxónica que permeia o nosso quotidiano.

 

Na minha opinião, acredito que o pensamento-chave é mesmo o fascínio e a curiosidade de procurar conhecer mais além do que nos é familiar. No meu caso, o que mais me cativa são as diferenças culturais: as mitologias, os trajes, a forma como ainda hoje conseguem manter o seu passado vivo (coisa que em muitos países não vejo a acontecer, o nosso incluído e quem sabe até a encabeçar a lista), a candura como as relações são retratadas – a insinuação de paixões ao invés da exibição a que assistimos na maioria das séries ocidentais, muitas paixões começam com pequenos gestos e não com grandes gestos de amor; as amizades que são as âncoras de estabilidade ao contrário de relações “parasitárias” de benefício que aparecem retratadas nas demais produções ocidentais, amigos que apesar das diferenças se mantêm unidos através da vida. Esta inocência aquece-me o coração e faz-me sentir mais optimista quanto ao mundo em que vivemos (é uma ilusão bonita pelo menos ^_^ ).

 

Ao contrário do Ocidente, quando uma série é lançada no Japão ou na Coreia do Sul, o espectador já sabe à partida a duração desta, logo, sabe o tipo de investimento a fazer na série e dependendo da história, se vale a pena ou não acompanhar. Por outras palavras, a constante renovação de séries em infinitas temporadas conforme as suas audiências é algo que há muito não me alicia porque basicamente estas só terminam quando os espectadores estão vencidos pelo cansaço e após “diluirem” a história ao máximo e darem ditos por não ditos e mortes por desaparecimentos…

 

Por estas e por muitas outras coisas (que não abordo neste texto que já vai longo) é que gosto tanto dos livros e produções orientais.

 

Recomendações:
Death note (manga, anime e 3 filmes live-action)
Fullmetal Alchemist (manga, anime)
Rurouni Kenshin (manga, anime e filme live-action)

Séries:
The First Shop of the Coffee Prince (Coreia do Sul)
Hanazakari no Kimitachi e (Japão)

Filmes:
The Vengeance Trilogy (Coreia do Sul)
Jeon Woo-Chi (Coreia do Sul)
→ Qualquer filme do Mestre Hayao Myiazaki (Japão)

 

Texto da autoria da Joana Neto Lima, autora do blogue Cantos Quebrados e uma das fundadoras do projeto ClockWork Portugal. Agradeço a disponibilidade e simpatia 😉

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Sobre Célia

Tenho 38 anos e adoro ler desde que me conheço. O blogue Estante de Livros foi criado em Julho de 2007, e nasceu da minha vontade de partilhar as opiniões sobre o que ia lendo. Gosto de ler muitos géneros diferentes. Alguns dos favoritos são fantasia, romances históricos, policiais/thrillers e não-ficção.