Autor: Yann Martel
Título Original: Beatrice and Virgil (2010)
Editora: Editorial Presença
Páginas: 176
ISBN: 9789722343855
Tradutor: Fátima Andrade
Origem: Recebido para crítica
Opinião: Beatriz e Virgílio, um romance que esteve em gestação durante cerca de 8 anos, é o primeiro da era pós Man Booker Prize, prémio obtido com o bem sucedido A Vida de Pi. À semelhança do anterior, Beatriz e Virgílio tem animais como personagens centrais – neste caso, uma burra e um macaco-uivador conversam junto a uma árvore; na Vida de Pi, um tigre de Bengala partilha um bote salva-vidas com um rapaz indiano.
Tal como Martel, Henry L’Hôte, a personagem principal, é um escritor com um segundo livro de muito sucesso sobre animais. Henry pretende escrever o seu terceiro livro sobre o Holocausto, mas não no estilo de realismo histórico como a maioria da ficção existente sobre o tema, como ele próprio refere, mas de uma forma original. A sua ideia consiste em publicar o livro em formato flip-book, metade ficção metade ensaio, para que o acontecimento possa ser devidamente explorado. No entanto, os seus editores não acreditam no sucesso da sua concepção e rejeitam categoricamente o livro.
Desiludido, Henry decide recomeçar a sua vida noutra cidade. Enquanto tenta esquecer o seu romance, começa a trabalhar num café, passeia o seu cão e responde a cartas dos seus leitores. Uma das cartas que recebe contém um pequeno conto de Gustave Flaubert, um excerto de uma peça teatral sem autoria e um sucinto pedido de ajuda.
Henry fica suficientemente intrigado para procurar o autor da carta e é desta forma que conhece Henry, o taxidermista: um septuagenário de modos bruscos e sombrios que gere uma antiga e sinistra loja de taxidermia. O taxidermista pede ajuda a Henry para terminar a sua peça de teatro onde figuram Beatriz, a burra, e Virgílio, o macaco-uivador – ambos embalsamados na sua loja. Excertos da peça vão sendo apresentados a Henry pelo taxidermista, o que permite perceber (ou desconfiar) que o taxidermista pretende referir-se ao tema do Holocausto, tal como Henry. Embora inicialmente Henry veja no taxidermista uma forma de reencontrar a sua inspiração para a escrita, aos poucos compreende a verdadeira essência e objectivo do homem: a expurga dos seus pecados.
No entanto, à excepção de uma cena particularmente violenta que Martel inclui na peça do taxidermista e que nos remete imediatamente para o Holocausto, para um livro que pretende ser uma alegoria da tragédia, não deixa de desiludir que o tema seja abordado de forma tão subtil. O tema deixa-se antever por uma intenção subentendida e em pormenores que vão sendo plantados num ou noutro ponto. Mas na maioria das vezes é como se não existisse um tema concreto e as personagens estivessem a divagar sobre coisa nenhuma – nomeadamente no que se refere à peça de teatro.
Beatriz e Virgílio é um livro estranho e algo confuso, com uma carga simbólica pesada – referências a Dante, Beckett – destinada a testar os conhecimentos e limites do leitor, tais como as perguntas intituladas de “Jogos para Gustavo” que são deixadas no final: “A tua filha está claramente morta. Se pisares a cabeça dela, chegas mais alto, onde o ar é melhor. Pisas a cabeça da tua filha?”. Embora se inicie de forma interessante, e até o final seja arrepiante, é o durante que não consegue cumprir e imprime uma sensação de desnorteio (seria esta a intenção?). Fica a ideia de que o autor poderia ter feito muito mais – à semelhança de A Vida de Pi. – Sofia Martins
Classificação: 5/10 – Razoável