[Opinião] A Herança de Eszter, de Sándor Márai

Autor: Sándor Márai
Título Original: Eszter hagyatéka (1939)
Editora: Biblioteca Sábado
Páginas: 180
ISBN: n.d.
Tradutor: Ernesto Rodrigues
Origem: Comprado

Sinopse: Durante vinte anos Eszter viveu uma existência cinzenta e monótona, fechada sobre si própria, esperando a morte e sonhando com o retorno de um amor impossível. Até ao dia em que, inesperadamente, recebe um telegrama de Lajos, o único homem que amou e graças ao qual encontrou, por um breve período, sentido para a sua vida. Grande sedutor e canalha sem escrúpulos, Lajos não só traiu Eszter como destruiu a sua família, tirando-lhe tudo o que possuía. Agora, depois de uma ausência prolongada regressa, e Eszter prepara-se para o receber comovida e perturbada por sentimentos contraditórios.

Opinião: Sándor Márai foi um escritor húngaro cuja vida e obra ficaram indelevelmente marcadas pela ascensão do comunismo no seu país de origem, que levou a que se exilasse do país por não concordar com este regime político, ficando a sua obra em grande parte votada ao esquecimento. Após a sua morte em 1989, assistiu-se à “recuperação” de muitos dos seus livros, que conheceram novas edições em vários países, incluindo Portugal. Por cá, o escritor tem mais três obras publicadas, para além deste A Herança de Eszter: As Velas Ardem até ao Fim, A Mulher Certa e Rebeldes, todos eles com assinalável sucesso entre os leitores portugueses. Por esse motivo, não podia deixar de sentir curiosidade em conhecer a sua obra e apesar de também ter As Velas Ardem até ao Fim decidi começar por este.

O ponto de partida desta história é uma carta que Eszter recebe de um antigo amor que a trocou pela irmã. Mas não foi só Eszter que Lajos prejudicou com as suas mentiras e esquemas ardilosos: toda a família foi, em maior ou menor grau, enganada e roubada por Lajos. A partir do momento em que a carta é recebida, Eszter começa a imaginar que motivos trarão Lajos de volta e o leitor é constantemente levado ao passado, através da recuperação de episódios que demonstram o carácter de Lajos que, apesar de prejudicar tantas pessoas, continuava estranhamente e exercer sobre elas um poder persuasor que as levava à irracionalidade.

A desconstrução desta enigmática personagem é um dos pontos altos deste livro, na medida em que o leitor se sente intrigado pelas motivações de Lajos e deseja, acima de tudo, conhecê-las. Apesar disso, não consegui evitar a sensação que o autor criou uma personagem tão complexa que acabou por não a conseguir descortinar completamente – talvez tenha sido propositado, deixando ao leitor a tarefa de o perceber por si próprio. A galeria de personagens secundárias é também deveras interessante, mas julgo que um livro mais extenso teria beneficiado a sua caracterização, bem como o enredo de um modo geral.

Mas do que gostei mais neste livro foi da escrita lúcida e absorvente, mostrando que não é preciso grandes floreados linguísticos para transmitir imagens vívidas e verosímeis perante o leitor. Sándor Márai cria, de uma forma aparentemente fácil, mas nunca simples, uma conjunto de personagens que “falam” a quem lê e que nos leva a interessar-nos pelo seu destino. É, sem dúvida, um escritor para continuar a acompanhar. 

Classificação: 7/10 – Bom

Livro n.º 60 de 2010

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Sobre Célia

Tenho 38 anos e adoro ler desde que me conheço. O blogue Estante de Livros foi criado em Julho de 2007, e nasceu da minha vontade de partilhar as opiniões sobre o que ia lendo. Gosto de ler muitos géneros diferentes. Alguns dos favoritos são fantasia, romances históricos, policiais/thrillers e não-ficção.